Arquiteto do Beira Rio: Valeu a pena!

Este foi o texto publicado no blog  Colorado,  ZH esportes, que li com muita emoção. Como este colorado deve estar se sentindo, entrando para história do clube desta forma? Só a paixão pode criar histórias assim. Foi uma emoção conjunta de todos que estiveram no estádio no primeiro jogo teste, e que se renovará até que cada sócio possa ir conhecer o Gigante remodelado, culminando com a reinauguração no dia 05 de abril.

Talvez a mais forte emoção seja do arquiteto colorado  Fernando Balvedi, com seus colegas de trabalho. O texto foi publicado pelo reporter do Colorado ZH esportes, Marcelo Gonzatto. Acompanhe.

“Sempre que me perguntam qual foi o primeiro jogo que assisti no Beira-Rio eu não sei o que responder. Não tenho essa lembrança, já que meu pai me leva ao Gigante desde que me conheço por gente. Sim, o Beira-Rio faz parte da minha vida desde muito cedo. Cresci subindo aquelas rampas rumo às cadeiras. Presenciei algumas derrotas que marcaram a vida de todo colorado, mas também vi as maiores glórias que um time pode alcançar bem ali, naquele colosso erguido na água. Não tive o prazer de ver Bodinho, Dom Elias nem Falcão jogando, mas vi Sóbis, Tinga e Fernandão. Talvez por isso, nem toda lógica do mundo sirva para explicar o que aconteceu naquele 8 de novembro de 2006.

Era um Inter x Santos. No intervalo, na fila de um dos bares, encontro o Roberto Leitão dos Santos, então meu cliente. Ainda não mencionei: sou arquiteto. Naquele dia, eu não tinha nem um ano de formado. Nem eu, nem o Gabriel, nem o Maurício, meus sócios na Hype Studio. Ali, o Roberto ficou sabendo que eu era colorado – e que o Gabriel e o Maurício também eram. Conversa vai, conversa vem, eu fiquei sabendo que ele era conselheiro do Inter. Quase no fim do intervalo o Roberto me diz: “Fernando, estamos montando dentro do clube uma comissão pra projetar uma cobertura pro Beira-Rio. É um sonho antigo da diretoria. Vocês não querem fazer parte e nos ajudar?”

O resto, como dizem por aí, é história. Eu, o Gabriel e o Maurício começamos a frequentar as reuniões. Éramos os únicos arquitetos. Lá por fevereiro de 2007, apresentamos para essa comissão nossa ideia para a cobertura: uma estrutura em módulos, erguida por fora do estádio, que iria alterar radicalmente a cara do Beira-Rio. Todos adoraram. E ficou decidido: vamos apresentar pro Vitorio. A apresentação para o presidente ocorreria em abril.

Logo no início dos trabalhos percebemos que nosso Gigante estava velho. Talvez tenham sido as inúmeras batalhas travadas ali, mas a verdade é que cobrir o Beira-Rio do jeito que ele estava não era suficiente. Por isso, entre novembro de 2006 e abril de 2007, projetamos lá na Hype uma reforma completa. Fizemos inúmeras visitas ao estádio, conhecendo lugares que não conhecíamos, entrando em salas que estavam fechadas, em alguns casos, havia uma década. Nosso plano: demolir a velha arquibancada inferior e construir uma nova, maior, grudada no campo; fechar todo o anel de suítes; colocar no estádio espaços encontrados nas modernas arenas europeias, como lojas, restaurantes, lounges vip; fazer toda a estrutura dos jogadores e da imprensa no padrão exigido em normas internacionais, entre outras inúmeras melhorias. Sim, o desafio seria enorme. Pensamos: “vão achar que somos loucos”.

No distante 2 de abril de 2007, entramos na sala de reuniões da presidência do Internacional para apresentar para o Vitorio, para o Emídio e para o Pedro, o nosso projeto da cobertura. Lá pelas tantas, quase no fim da apresentação, o Vitorio falou: “para! Não precisa mostrar mais nada, nós vamos construir isso!”. Os olhos de todos brilhavam. Foi então que falamos: “ok, nós temos mais uma coisa pra mostrar. Não se assustem, mas nós achamos que só cobrir o estádio é pouco”. Apresentamos o projeto de reforma completo. O mundo dá voltas, mas nesse caso, “voltas” é um eufemismo. Foi um verdadeiro furacão. O Vitorio, o Emídio e o Pedro toparam aquilo. Como o Emídio viria a me dizer anos mais tarde: “Vocês eram três loucos. Encontraram outros três loucos no clube. Deu no que deu”.

Eles eram três à frente de um exército: tinha o Décio, o Bottini, o Limeira, o Mário Sérgio, o Mussoi… O problema de citar nomes é que a gente sempre esquece alguém. Paciência. Depois daquele dia, foram mais sete anos de muito trabalho. O torcedor não fica sabendo, mas tem muita história… Apresentamos o projeto pro Ministro dos Esportes. Apresentamos pra Fifa, em inglês! Fomos pra Europa visitar quase 20 estádios em questão de dois meses – e a gente levava fita métrica pra medir o que precisasse dentro das arenas. Fomos escolhidos como sede de uma Copa do Mundo. Visitamos as obras da África do Sul. Trabalhamos muito. Nada foi fácil. Foi como as maiores campanhas do Internacional: sofrido.

Em 2010, a obra começou com recursos próprios. Depois parou, e veio a negociação do contrato com a Andrade Gutierrez. Pra quem assistia de fora parecia que não terminava nunca. A gente sabia: estão deixando tudo claro antes pra não ter problema depois. É complexo sim, basta ver o tamanho da empreitada! Aí foi a vez de mais um trio fazer história: o Giovanni, o Anápio e a Diana. Claro, como falei antes, eles também eram três à frente de mais um exército – que tinha o Maximiliano, o Aquino, o Keller, o Bolognesi, o Busnello…

Contrato assinado, mãos à obra. Mais um trio, agora da construtora – o Lúcio, o Roberto e o Rodrigo. Novamente, à frente de outro exército – agora, de quase duas mil pessoas. Sofrido também. Dois anos de muito trabalho, muita dedicação. Um esforço sobre-humano que acompanhamos dia após dia. Quando caminhávamos pela nova inferior, ainda em obras, parávamos ali e comentávamos: “quando a torcida entrar aqui pela primeira vez, vai enlouquecer”. Vimos a cobertura subir módulo por módulo e tínhamos a certeza: parece outro estádio. E era. Mas as histórias, as lembranças, as vitórias… nada disso ia mudar. A alma ainda era a mesma. Finalmente, chegou o grande dia. E lá fomos nós.

Naquele fim de tarde de 15 de fevereiro de 2014, lá estávamos eu, o Gabriel e o Maurício, sentados bem próximos de um dos acessos para acompanhar a reação dos torcedores assim que contemplavam pela primeira vez o Gigante reconstruído. E a cada sorriso, lágrima ou suspiro, tínhamos uma certeza: valeu a pena. Valeu cada noite virada. Valeu todo o stress. Não sei se era alívio, recompensa, felicidade… tudo se juntava num só sentimento. Deve ser mais ou menos a sensação do capitão erguendo uma taça.

Esqueça a política. Esqueça as vaidades. Guarde uma lembrança dessa batalha épica que narrei: esse projeto, que saiu da cabeça de três jovens arquitetos colorados tentando fazer o melhor pelo clube do coração, saiu do papel por causa de muitos outros colorados que souberam juntar esforços pelo bem do Inter e seus torcedores. Vai ter uma geração de colorados que, a partir desse momento, só vai conhecer o novo Beira-Rio. Eles vão ouvir histórias de outros colorados sobre como era assistir um jogo sentado no concreto frio, com chuva na cabeça e o vento gelado do Guaíba. Graças a todos esses nomes que citei (e outros tantos que não consegui citar), essa nova geração vai torcer em um estádio de padrão internacional. Sem arame farpado, com cadeiras confortáveis bem próximas do gramado, protegidos da chuva. E é graças a todos eles que a partir de hoje eu posso dizer quando me perguntarem: o primeiro jogo que vi no Beira-Rio foi Inter 4 x 0 Caxias. Pelo menos no novo Beira-Rio. No antigo, eu continuo não sabendo.”

Fernando Balvedi é arquiteto, diretor da Hype Studio Arquitetura. Ele e seus sócios Gabriel Garcia e Maurício Santos são os autores do projeto arquitetônico do novo Beira-Rio.

Postado por Marcelo Gonzatto, às 6:00

Categorias: Beira-RioHistória

2 thoughts on “Arquiteto do Beira Rio: Valeu a pena!

  1. Bah! Se nos emocionamos só em saber que teríamos um estádio magnífico como o que estamos presenciando, imagina então para quem participou diretamente na idealização, planejamento e execução dos trabalhos para que esse sonho fosse hoje uma realidade para todos nós! Merecem o reconhecimento de toda nação colorada! Parabéns e obrigado a esses grandes colorados! SC

  2. Alô você Adri!
    Fico imaginando a satisfação incontida no peito desses colorados. Idealizaram e tornaram real um sonho, um anseio, pásmem, de José Pinheiro Borda, o homem que idealizou o Beira-Rio e que só não o cobriu integralmente porque não havianumerário suficiente e que por isso mesmo fez aquele chapéu no lado oposto ao das antigas sociais e lá mandou inscrever; ‘A MAIOR TORCIDA DO RIO GRANDE” pra que todos lembrassem e que um dia talvez com esforço maior ainda que o primeiro concluísse sua obra. Parabéns moçada, voces tornaram realidade o sonho de milhões e sobretudo o sonho do velho Pinheiro Borda.
    Coloradamente,
    Melo

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